Atuação de negociador em conversa com Roberto Jefferson é criticada na PF
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O vídeo em que um agente da Polícia Federal aparece conversando com Roberto Jefferson após o ataque a tiros do ex-deputado contra policiais gerou críticas dentro da corporação.
Colegas do agente Vinicius Secundo classificam a postura do policial como benevolente e excessivamente amistosa com Jefferson, que poucas horas antes havia deixado dois policiais federais feridos após reagir ao cumprimento da ordem de prisão expedida pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).
Integrante do grupo tático da PF fluminense, Secundo afirma na conversa que estava no local para negociar e que iria fazer o que o ex-deputado precisasse.
Segundo integrantes da Polícia Federal, a função do policial era distensionar o ambiente e ajudar na negociação. Suas falas, no entanto, foram vistas internamente como inusuais em uma situação como a vivida no domingo (23).
Por causa da repercussão do vídeo, Secundo escreveu uma mensagem que passou a circular em grupos com integrantes da PF. Ele afirma que "vestiu um personagem para desacelerar a situação da melhor maneira possível".
Para policiais ouvidos pela Folha de S.Paulo, não havia necessidade de ele ter sido tão cordial e travar uma conversa tão longa com Jefferson uma vez que a prisão já estava decretada, e o alvo havia reagido contra seus próprios colegas.
A prática nesses casos, afirmam, era somente cumprir o mandado e conduzir Jefferson até a viatura.
No entendimento dos policiais, o agente falou muito e abriu brecha para críticas e afirmações de que Jefferson teve um tratamento diferenciado por ser aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Além do tom, dois trechos causaram as maiores reclamações: o momento em que ele dá risadas quando Jefferson fala das granadas de efeito moral; e quando ele aborda a origem dos colegas atacados pelo ex-parlamentar.
Sobre os colegas, inclusive os dois feridos, Secundo afirma que "os meninos que vieram aqui são da inteligência, eles não sabem nem o que é isso" e que "eles são burocráticos, trabalham em escritório, não são operacionais".
Os policiais que participaram da ação são do SIP (Setor de Inteligência Policial). A área dentro da PF é acionada em casos sensíveis, como era o de Jefferson.
O SIP é o setor nas superintendências estaduais que representa a DIP (Diretoria de Inteligência Policial), que fica na sede em Brasília.
Em defesa do negociador, policiais argumentam que a situação era crítica e havia necessidade de baixar a temperatura para evitar novos problemas.
Embora também afirmem que o policial foi infeliz em trechos de sua fala, esses colegas de PF citam que havia muitos apoiadores bolsonaristas na entrada da residência e a situação era complicada.
Nesse cenário, a postura do policial foi vista como necessária para que Jefferson não tentasse outra manobra e colocasse em risco os envolvidos na ação.
Na conversa, o policial dá risada ao escutar de Jefferson que eram granadas de efeito moral as duas arremessadas e cujos estilhaços causaram ferimentos nos policiais.
Segundo Jefferson diz ao policial, a primeira granada foi jogada na frente da viatura, quando os policiais se esconderam atrás dela. Em seguida, afirmou, os policiais teriam descido a rua da entrada da casa e, nesse momento, ele jogou a segunda granada.
No vídeo, o policial ainda ouve a versão de Jefferson de que não queria atingir ninguém.
"Eu quero dizer uma coisa. Não atirei neles, eles sabem disso, eles sabem disso. Eu cheguei, eles estavam embaixo. Eu falei: vocês não têm como me levar, vocês não estão armados. Todo mundo sem colete, de peito nu", disse ao policial.
A versão de Jefferson é que "só" um policial atirou nele, um "magrinho".
No entendimento de colegas do agente, a existência do vídeo permite a narrativa de um tratamento diferenciado, distinto de uma negociação com um traficante ou um pedófilo, por exemplo.
Eles questionam também o fato de o negociador demonstrar na conversa entender e concordar com os motivos de Jefferson.
Para eles, Secundo não confrontou o político em nenhum momento e se deixou filmar em uma situação delicada para a PF.
Outro trecho citado por policiais é o em que ele tenta minimizar o ataque de Jefferson e diz que os "meninos estão bem" e "tá tudo tranquilo" --em alusão aos colegas feridos durante a ação.
A forma de atuação de Secundo serviu como gatilho para críticas à gestão da Polícia Federal sob o governo de Jair Bolsonaro. Também foi considerada equivocada a própria escolha da equipe e do agente para conduzir a negociação. Segundo relatos, Fecundo é conhecido na PF do Rio de Janeiro e não teria o perfil ideal para esse tipo de situação.
LEIA A ÍNTEGRA DA MENSAGEM DO AGENTE VINICIUS SECUNDO A INTEGRANTES DA PF
"Senhores o colega que está no vídeo sou eu! Pra quem não sabe sou chefe substituto do GPI e do NEPOM RJ. Sou negociador formado pela COT! A responsabilidade da negociação era enorme, não havia condições de fazer uma entrada tática com tantas pessoas na casa e a informação que havia várias armas! Virou um gerenciamento de crise, se sai um inocente ferido ou morto seria uma tragédia e nome da PF na lama! Eu vesti um personagem para desacelerar a situação da melhor maneira possível! Graças a Deus tudo terminou bem sem ninguém ferido ou morto e o perpetrador preso! Infelizmente não dá para colocar todos os detalhes aqui, mas tenham certeza que se a equipe do GPI estivesse no momento da troca de tiro o resultado poderia ser outros mas chegamos com uma situação de gerenciamento de crise, ai toda conduta muda! Abraço a todos".
ASSUNTOS: Caso Prisão Roberto Jefferson